quinta-feira, 9 de julho de 2015

Sete Vidas termina com final irregular e grave defeito de argumento.

Sete Vidas passou pelos seus meses de exibição da melhor forma possível. O argumento era matador: uma nova família formada pelos métodos contraceptivos contemporâneos. Mas ele não foi concluído, enlaçado, problematizado em sua principal questão: o verdadeiro compromisso ético do protagonista Miguel (Domingos Montaigner) com a sua "família". Um homem que doa seu material genético em uma clínica de inseminação não se transforma automaticamente em pai: Lígia (Débora Bloch), esposa de Miguel, era a única com direitos legítimos. Os outros filhos, no entanto, não tinham um elo automático com o protagonista, algo óbvio para qualquer pessoa. Isso, contudo, não parecia um buraco no início da novela: Lícia dava sinais de que, mais tarde, caminharia para discussões nesse sentido. Mas nada disso aconteceu.
 
É bem verdade que o desenvolvimento foi quase perfeito. Lícia soube dosar com razoabilidade a complexidade os temas dos quais tratou. Em um horário utilizado para novelas água-com-açúcar, Sete Vidas soube manter o seu apelo comercial sem comprometer a qualidade textual presente na narrativa e na dramaturgia da autora. Tudo foi planejado e executado com certo cuidado, uma prática cada vez menos comum em tempos em que roteiristas acreditam que novelas precisam necessariamente replicar o ritmo dos seriados americanos. Mas o que veio depois, o que chamo de enlace, não apareceu (nem no desenvolvimento, nem na conclusão). A novela ficou manca, até meio piegas: Miguel, por uma espécie de chamado consanguíneo, tornou-se o pai de pessoas com as quais nunca havia convivido. Uma boçalidade em tempos em que o Direito Civil, por exemplo, luta com conceitos tão rasos de família.
 
Para completar, o final de Sete Vidas foi bastante irregular. Mal e porcamente, Lícia criou possibilidades para suas histórias. Nenhuma dessas possibilidades, porém, esteve justificada no contexto de sua narrativa. Como uma dramaturga iniciante, Lícia apenas criava curvas aleatórias em suas tramas: do dia para a noite, Felipe (Miguel Noher) precisava ir para Uganda e Luísa (Eline Porto) "achou" uma bolsa de estudos em Londres. Fatos que transcorreram de maneira nada crível. Não é assim que se escreve uma novela. Não é assim que escreve teatrinho de colégio. Os finais dos protagonistas, assim, desenvolveram-se, todos, de modo muito tacanho: surpreendeu a falta de habilidade de autora de estabelecer traços de empatia com a trama do trio principal, algo que poderia ter sido desenvolvido em uma cadeia causal mais cuidadosa: Júlia (Isabelle Drummond) e Felipe, pelo contrário, tiveram uma história abruptamente interrompida. Sem nenhuma estratégia de roteiro mais elaborada, Lícia apenas decidiu separar o casal em benefício de Pedro (Jayme Matarazzo). Nada, porém, parece ter justificado a repentina mudança de inclinação da mocinha. Restou, assim, o bom final de Miguel e Lígia, que de fato soou como o mais acertado. Entretanto, mesmo o enlace dos protagonistas maduros sofreu entraves desnecessários. O impulso de Ulisses que voltou a tomar conta de Miguel nos capítulos finais externou uma falta de criatividade.

Houve, ainda, os remanejamentos justificados por um excesso de pedantismo que, vale dizer, também sempre comprometeu e tirou um pouco da alma da novela. Como explicar, por exemplo, a decisão de Luís, personagem de Thiago Rodrigues, que, mesmo depois de meses de uma bela construção de argumento com sua terapeuta (Isabel, em uma bom retorno de Mariana Lima às novelas), teve que seguir sozinho? Isso depois de, mais uma vez, um elemento estranho ter sido incorporado ao roteiro sem muita causalidade: Isabel "achou" uma pós-graduação no exterior, algo que parece muito comum, pelo visto, no cotidiano da autora. E o que dizer da cura gay de Esther, uma mulher de sessenta anos mais do que resolvida? É bem verdade que bissexualidade é um fato em todas as idades. Mas também é verdade que Esther nunca havia demonstrado essa inclinação. Nada disso colou.
 
Sete Vidas, assim, terminou com um ar de novela interessante, mas com problemas contundentes. Lícia tem o talento de saber contar histórias de maneira bem razoável, inteligente, problematizada. Mas falta aquele plus que existe nos grandes autores, aquele plus que mistura cuidados técnicos com elementos de catarse. Do primeiro elemento, restam atropelamentos e fatos achados. Do segundo, sobram opções erradas em seus desfechos (algo também perceptível em A Vida da Gente). É justamente na hora de tomar decisões que Lícia se atrapalha. Talvez por tentativas pouco efetivas de surpreender.

De absolutamente positivo, cabe citar a direção e o elenco. Jayme Monjardim se recuperou da péssima impressão que seu núcleo deixou em Em Família. Malu Galli, por seu turno, foi o grande destaque entre os atores. Ainda que estivesse na trama mais clichê da novela (e desenvolvida do modo mais clichê possível, vale dizer), Malu conseguiu colocar para fora todo uma explosão que muitas vezes teve que ficar mais escondida em papéis menos dramáticas. Uma atriz gigante.


 
7,5/10

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