quarta-feira, 17 de novembro de 2021

Caso Camila Queiroz e baixa audiência de Um Lugar ao Sol são sinais de alerta

    A Rede Globo domina o cenário da teledramaturgia nacional há décadas. É inegável que a emissora trilhou um caminho de sucesso e qualidade que lançou talentos e monopolizou o mercado durante todos esses anos. Entretanto, a emissora passa por uma fase curiosa atualmente. E dois fatos destacaram uma época que, pelo menos nos últimos anos, é inédita para a emissora dos Marinho.

    Quando Walcyr Carrasco anunciou que estava trabalhando na segunda temporada de Verdades Secretas, o mundo das novelas se agitou. Afinal, esse é inegavelmente o melhor dos seus trabalhos, uma produção que conquistou audiência e crítica por sua direção inovadora e um texto que, de tão maduro, nem parecia ser escrito por Walcyr. Verdades Secretas 2 ainda trazia interessantes adições ao elenco (Ícaro Silva, Maria de Medeiros, Rodrigo Pandolfo, Johnny Massaro) e uma nova diretora, Amora Mautner, conhecida por sucessos como Avenida Brasil e Cordel Encantado. Mas uma coisa chamava a atenção: a Rede Globo, talvez prevendo o que estava por vir no que diz respeito a conteúdo, fiou-se excessivamente nas quentes e numerosas cenas de sexo que a trama trazia. Nada contra quentes e numerosas cenas de sexo, diga-se de passagem, mas, logo que a novela estreou, percebeu-se que as cenas de sexo eram mais um chamariz em meio a uma produção sem conteúdo e qualidade do que partes de um roteiro amarrado e coeso. À parte do excelente elenco, Verdades Secretas 2 derrapa em todos os setores. O texto clássico de Walcyr, infantil, afetado, piegas, pobre, está de novo lá. Não só presente em constrangedores diálogos, mas em cenas descontextualizadas e em um roteiro tão sem sentido que beira o ridículo. A direção de Amora é escura, de mau gosto, brega, cafona, uma clara tentativa de imitar a sensível e elegante direção de Mauro Mendonça Filho, responsável por comandar a primeira temporada. Amora mostra uma São Paulo que não parece São Paulo, tira a alma da cidade e coloca-a em um lugar genérico típico de diretores iniciantes. A tentativa de imitar o ambiente noir e indie de Maurinho faz a direção de Amora parecer deslocada e, no fim, feia, com uma fotografia tão obscurecida que mal se vê o trabalho da direção de arte. Como se não bastasse, o excesso de cenas escuras é usada para obliterar as tão publicizadas cenas de sexo, uma estranha dinâmica que, ao mesmo tempo em que se vende com um ar de liberdade sexual, coloca corpos e sexualidades em uma sombra como se, no fim das contas, eles tivessem vergonha de si mesmos. Não é arriscado dizer que o sucesso da primeira temporada fica bem mais na conta de Mauro Mendonça Filho e Maria Elisa Berredo, dois nomes já conhecidos por sua razoabilidade e criatividade, do que na de Walcyr Carrasco ou qualquer outro nome envolvido nessa continuação. Também chama a atenção o pouco talento de Amora Mautner, algo que já dava para perceber em novelas como A Regra do Jogo e A Dona do Pedaço.

    Em um vazio narrativo e em uma direção errante, entra o nome de Camila Queiroz. Camila foi demitida da novela porque, segundo nota da Globo, não queria prolongar o seu contrato por mais de uma semana e assim concluir os trabalho sem que a emissora cumprisse uma série de condições. Segundo a emissora carioca, Camila chegou a exigir que o fim escrito por Walcyr Carrasco fosse alterado. Aqui, duas coisas: obviamente um ator não tem o direito de exigir alterações no roteiro, mas um ator envolvido em tamanha bagunça não é também diretamente afetado por todos esses deslizes de produção, principalmente quando esse caos (caos ao que Walcyr, diga-se de passagem, parece adorar enquanto método) influi diretamente nos rumos do seu personagem? A segunda coisa: como a Rede Globo não celebra cuidadosos contratos com atores que estão no ar em suas produções? Parece amadorismo e pouco cuidado com seu próprio portfólio. Em tempos de pandemia e de concorrência de qualidade (Netflix, HBO Max), é pouco profissional que o maior produtor de telenovelas do mundo não faça contratos automaticamente extensíveis ou mesmo maiores, contemplando um período de tempo capaz de contornar possíveis adiamentos. 

    Nisso, chego a um outro ponto: o amadorismo da Rede Globo parece ter se intensificado depois da pandemia. Muita coisa aconteceu de 2019 para cá: paralisação das gravações, a mudança da direção de dramaturgia, os novos rumos traçados pelo canal. Institucionalmente, nenhum A pode ser dito a respeito da empresa: a Globo respeitou de forma exemplar todos os protocolos de segurança e garantiu a saúde de todos os seus funcionários. Isso sem contar com a excelente cobertura que a emissora fez da crise da Covid, até mesmo orientando a população em um assunto que o péssimo governo atual, aparentemente, resolveu ignorar. Mas a volta aos trabalhos parece abrupta, mal-planejada e com escolhas questionáveis. A Globo decidiu, antes mesmo da estreia, decretar o fracasso da ótima Um Lugar ao Sol, novela das 9 escrita por Lícia Manzo. A trama é atual, dinâmica, cativante, bem-escrita, tem uma direção interessante, um elenco indefectível. A Globo, porém, resolveu que simplesmente não iria investir em divulgação. Pouco se ouviu da novela antes da estreia, poucas inserções em outros programas, pouco alarde para aquela que seria a primeira novela inédita no horário nobre desde a apressada parte final de Amor de Mãe. Tudo para privilegiar Pantanal, uma aposta arriscada em uma novela que, apesar do ícone, pode reproduzir fracassos retumbantes de outros remakes, ainda mais considerando o seu difícil aspecto datado de um mundo rural que já não é mais o mesmo, em uma região que já não é mais a mesma, em uma dinâmica de relações que não é mais a mesma, com um elenco ainda mais branco do que a versão da Manchete, em um país com quase 50% de pessoas não-brancas. Digo, é claro que Pantanal merece ser divulgada, mas a meses de estreia e com uma novela na frente, a publicidade em torno de uma obra com estreia prevista bem depois parece no mínimo uma empolgação injustificada de um setor de dramaturgia que parece não entender bem o que espera o brasileiro. Obviamente, Um Lugar ao Sol vem batendo recordes negativos de audiência, mesmo sendo o lançamento de mais qualidade do ano.  

    O que fica disso tudo: a Globo precisa colocar o trem de volta aos trilhos. Talvez pela mudança de direção ou pela dificuldade dos tempos, uma sombra parece habitar o PROJAC nos últimos tempos. Talvez seja a sombra da direção de Amora em Verdades Secretas. A verdade, mesmo, ninguém sabe; só se pode intuir. 

domingo, 1 de agosto de 2021

XI Prêmio Leila Diniz (Vencedores)

Troféu de Honraria ao Valor Bio e Filmográfico:

 

- Marieta Severo, por sua biografia impecável nas artes cênicas e luta pessoal pela valorização da arte.

 

- Paulo Gustavo, pela contribuição única por disseminar a diversidade na arte e na cultura nacionais.

 

 

Prêmio Elke Maravilha de Cultura em Rádio e TV:

 

- Sinta-se em Casa, com Marcelo Adnet, pelo inegualável trabaho de levar humor crítico ao brasileiro durante tempos tão difíceis.

 

 

Atuação em Série Nacional:

 

- Camila Morgado (Bom dia, Verônica), pela magnífica interpretação de uma mulher vítima de violência doméstica, papel em que Camila passa, apenas com o olhar, toda a tensão acumulada pela personagem.

 


Atuação Coadjuvante em Série Nacional
:

 

- Tatiana Tibúrcio (Falas Negras), que na pele de uma mãe que perdeu o filho para a estrutura extremamente racista de nosso país, entregou uma atuação que emocionou o Brasil

 


Série Nacional:

 

- Bom Dia, Verônica (Netflix), pelo roteiro primoroso, pela direção eficiente, pelas atuações magníficas, pela coragem de tocar em temas sociais sem cair no piegas.

 

 

Melhor Série ou Novela Internacional:

 

- Pose (Fox, Estados Unidos), pelo primoroso trabalho que retrata a cultura gay, trans e negra norte-americana no fim dos anos 80 e no início dos 90.

 

 

Trilha Sonora:

 

- Coisa Mais Linda (Netflix), pelo ótimo compilado de Bossa Nova e Música Popular Brasileira.

 


Fotografia:

 

- Desalma (Globoplay), pela linda e sombria fotografia da série.

 


Figurino
:

 

- Cidade Invisível (Netflix), pela eficiente antropomorfização de lendas como o Curupira e a Cuca.

 


Direção de Arte:

 

- Bom Dia, Verônica (Netflix), pela excelente reconstrução da vida social da classe média brasileira. Destaque para a casa suburbana de Brandão e Janete.

 


Direção
:

 

- José Henrique Fonseca, Izabel Jaguaripe e Rog de Souza (Bom Dia, Verônica), pela excelente transposição da tensão presente no roteiro, tanto nas sequências mais violentas  quanto nas cenas em que o subtexto precisa ser absorvido pela expressão dos atores.  

 

 

Autor:

 

- Raphael Montes e Ilana Casoy, com Carol Garcia, Davi Kolb e Gustavo Bragança (Bom Dia, Verônica), pela excelente adaptação do roteiro e eficiente desenvolvimento de todas as tramas. 

domingo, 18 de julho de 2021

O que existe de válido na nova onda de documentários sobre as celebridades do momento?

     Quando me deparo com um documentário como o que acompanha um recorte da agenda da cantora Anitta ou o que reconstrói a trajetória da ex-BBB Juliette, fico me perguntando em como o formato foi repaginado em uma espécie de apelo fast-food. Ao menos antes da popularização dos serviços de streaming, os documentários biográficos compreendiam uma vida ao menos madura, algo com uma bagagem cheia e relevante de uma existência que não se resumia a acompanhar 2 ou 3 meses da carreira de uma celebridade que é o hit do momento. A verdade é que o dinheiro que essa nova moda rende é garantido e faz com que as plataformas invistam mais e mais nesses reality shows com apelo documental, os quais parecem ter conseguido seu gatilho no célebre programa Keeping Up with the Kardashians, que acompanhava a rotina de uma abastada família de socialites armeno-americanas (e que projetou a fama de Kim Kardashian e das irmãs Jenner). É verdade que em algumas situações, esse novo formato fast food de documentário tem a sua substância. A Vida Depois do Tombo, por exemplo, visitou Karol Conka depois que a cantora passou por um massivo processo de linchamento após sua participação em um reality show. Questões como saúde mental e abuso psicológico nas relações interpessoais (típicas nesse tipo de programa, vale dizer) entraram em pauta e suscitaram discussões interessantes. Mas qual o real valor em ver um documentário sobre Juliette que sequer ultrapassa o mito que se criou no BBB; que, à parte de retratar uma figura indubitavelmente carismática e um fenômeno nas redes sociais, reduziu a moça a uma imagem piegas e superficial constantemente reafirmada ao longo dos já exibidos episódios da produção? Quem aguenta a edificação de uma personagem que em nenhum momento abandona o estereótipo e é colocada como vítima em contextos claramente multilaterais? E o que dizer dos "documentários" envolvendo a cantora Anitta? Qual a graça de acompanhar a sua sanha por sucesso profissional, sua construção de personagem igualmente superficial que é colocada como mulher de poder em um mundo que, cada vez mais, é marcado por desigualdades que não se resumem apenas aos abismos de gênero, mas que são interseccionadas por raça, classe e sexualidade? É claro que duas enormes bases de fãs já são capazes de justificar a existência dessas produções. Mas confesso que, na qualidade de telespectadora neutra, ambas as experiências me foram maçantes e a única coisa que me causou em relação às protagonistas foi um sentimento de natural antipatia. 

terça-feira, 13 de julho de 2021

XI Prêmio Leila Diniz (Indicados)

Devido à pandemia da COVID-19 e a paralisação na maioria das produções, o blog excepcionalmente não elegerá novelas ou os seus profissionais entre os melhores do ano. O XI Prêmio Leila Diniz se concentrará, assim, em séries e especiais. 

Previsão de resultado: 8 de agosto.



Série Nacional

Bom Dia, Verônica (Netflix)

Cidade Invisível (Netflix) 

Gilda, Lúcia e o Bode (Globo)

Manhãs de Setembro (Prime Vídeo)

Melhor Série ou Novela Internacional:

Katla (Netflix, Islândia)

Pose (Fox, Estados Unidos)

The Mandalorian (Disney Plus, Estados Unidos)

Young Royals (Netflix, Suécia)

Autor:

Alice Marcone, Carla Meirelles, Marcelo Montenegro e Josefina Trotta (Manhãs de Setembro)

Jorge Furtado, Fernanda Torres e Antonio Prata (Gilda, Lúcia e o Bode)

Manuela Dias (Falas Negras)

Raphael Montes e Ilana Casoy, com Carol Garcia, Davi Kolb e Gustavo Bragança (Bom Dia, Verônica)

Trilha Sonora:

Cidade Invisível (Netflix)

Coisa Mais Linda (Netflix)

Falas Negras (Globo)

Filhas de Eva (Globoplay)


Fotografia

Bom Dia, Verônica (Netflix)

Coisa Mais Linda (Netflix)

Desalma (Globoplay)

Manhãs de Setembro (Prime Vídeo)


Figurino
:

Bom Dia, Verônica (Netflix)

Coisa Mais Linda (Netflix)

Cidade Invisível (Netflix)

Desalma (Globoplay)


Direção de Arte:

Bom Dia, Verônica (Netflix)

Cidade Invisível (Netflix)

Desalma (Globoplay)

Manhãs de Setembro (Prime Video)


Direção
:

José Henrique Fonseca, Izabel Jaguaripe e Rog de Souza (Bom Dia, Verônica)

Júlia Pacheco e Luis Carone (Cidade Invisível)

Lázaro Ramos (Falas Negras)

Luís Pinheiro e Dainara Toffoli (Manhãs de Setembro)


Atuação Coadjuvante em Série Nacional:

Fábio Lago (Cidade Invisível)

Karine Teles (Manhãs de Setembro)

Marina Provenzzano (Bom Dia, Verônica)

Tatiana Tibúrcio (Falas Negras)

Atuação em Série Nacional:

Camila Morgado (Bom dia, Verônica)

Eduardo Moscovis (Bom dia, Verônica)

Fernanda Montenegro (Gilda, Lúcia e o Bode)

Liniker (Manhãs de Setembro)