terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Melhores do Ano 2014 (IV Prêmio Leila Diniz): Vencedores

Para relembrar todos os indicados, clique aqui.


Novela: Meu Pedacinho de Chão (Benedito Ruy Barbosa) - 68%

Atriz: Drica Moraes (Império) - 62%

Ator: Irandhir Santos (Meu Pedacinho de Chão) - 87%

Atriz Coadjuvante: Vanessa Gerbelli (Em Família) - 69%

Ator Coadjuvante: Luís Miranda (Geração Brasil) - 41%

Autor: George Moura (Amores Roubados) - 59%

Direção: Luiz Fernando Carvalho (Meu Pedacinho de Chão) - 67%

Série Nacional: Amores Roubados (George Moura) - 76%

Atuação Feminina em Série Nacional: Dira Paes (Amores Roubados) - 50%

Atuação Masculina em Série Nacional: Murilo Benício (Amores Roubados) - 48%

Trilha Sonora: O Rebu (José Luiz Villamarim) - Prêmio Técnico

Fotografia: O Rebu (Walther Carvalho) - Prêmio Técnico

Figurino: Meu Pedacinho de Chão (Thanara Schoernardie) - Prêmio Técnico

Direção de Arte - Meu Pedacinho de Chão (Marco Cortez) - Prêmio Técnico

Abertura: Boogie Oogie - Prêmio Técnico


Obs.: Os prêmios técnicos não foram abertos para votação.

Retrospectiva 2014: o que marcou e o que decepcionou

O que marcou:

1 - Dupla Identidade: O seriado começou com um sério problema de excesso de didatismo verbalizado em cena pela sempre verde Luana Piovani. Com o passar dos capítulos, porém, a história de Glória Perez ganhou dinamismo e deu mais espaço a performances de grandes atores, notadamente a de Bruno Gagliasso, o protagonista. O roteiro se tornou envolvente e mostrou que a autora, quando quer, ainda consegue fazer grandes trabalhos. Surpreende o fato de Glória, acostumada à clássica estrutura dos épicos folhetins à la Glória Magadan, ter conseguido desenvolver com maestria uma história de traços bem mais crus. Boa surpresa.

2 - Amores Roubados: Mas a grande série do ano foi, sem dúvida alguma, Amores Roubados. De George Moura, a produção se destacou mais por seu primor técnico: a direção de José Luiz Villamarim, a fotografia de Walther Carvalho e o apuro dramático de um elenco irrepreensível. Um trabalho em conjunto que rendeu um dos maiores produtos da teledramaturgia brasileira dos últimos anos.

3 - Meu Pedacinho de Chão: Luiz Fernando Carvalho transformou o texto conservador de Benedito Ruy Barbosa em uma obra revolucionária. Poucos diretores, aliás, têm a liberdade de Carvalho ao executar os seus trabalhos. E Carvalho, ciente dessa prerrogativa, sabe muito bem aproveitar os seus recursos. Meu Pedacinho de Chão, não fugindo à regra, abusou de uma edição inovadora, uma fotografia ímpar e um figurino encantador. A trilha sonora também foi destaque.

4 - O Rebu: O Rebu certamente poderia ter sido melhor. O roteiro se perdeu um pouco no desenvolvimento da novela, é verdade. Mas a direção de Villamarim mais uma vez se diferenciou. Trilha sonora memorável e uma fotografia que foi conduzida, apesar de injustas críticas, pelo sempre maravilhoso Walther Carvalho. Assim, a novela ganhou seus contornos de novelão: pelo menos, a trama de estreia de George Moura e Sérgio Goldenberg foi revolucionária no aspecto técnico. Mas se o roteiro não foi dos melhores, o último capítulo funcionou como redenção: emocionante e coerente, o desfecho foi um dos melhores dos últimos anos. É verdade que o saldo bem-sucedido da trama também deve suas razões a um elenco acertadíssimo: Patrícia Pillar, Sophie Charlotte, Cássia Kis Magro e Camila Morgado se destacaram com toda a justiça.

5 - Masterchef Brasil: O reality de culinária da Band surpreendeu pela qualidade técnica. Jurados bem escolhidos, participantes diversos e uma direção bastante acertada. E o melhor: sem nenhum tipo de excesso de sensacionalismo. Algo que infelizmente é difícil de ver fora da Rede Globo. O sucesso foi tanto que a emissora paulistana já planeja uma nova edição no ano que vem. 

6 - Boogie Oogie: Ruy Vilhena veio de Portugal em uma espécie de lobby feito pelo colega Aguinaldo Silva. Jovem, o autor português já havia feito nome no país dos patrícios com suas boas novelas. E com méritos. É o que vem mostrando a atual novela das 18 horas, Boogie Oogie. Apesar da ambientação ruim, Ruy Vilhena trouxe às novelas características de seriado: uma sequência grande de plot twists movimenta os capítulos. Há quem diga que Boogie Oogie é uma novela tradicional. Ledo engano.




O que decepcionou:

1 - Império: O tal novelão de Aguinaldo Silva virou novelinha. Previsível no que tinha que ser surpreendente e surpreendente no que tinha de ser previsível. Todos os bons personagens perderam sua razão de ser: a transexual virou hétero, a megera virou dondoca, o protagonista anti-herói virou herói. E nada se salvou. Nos últimos tempos, o autor se rendeu a uma espécie de recurso ao absurdo. Em uma novela que começou em uma espécie de realismo épico. Do dia para a noite, metade do elenco iniciou uma busca incessante por partes de um cristal "encantado". Houve até cirurgia plástica que transformou Drica Moraes em Marjorie Estiano. Um horror.

2 - The Voice Brasil: O reality musical brasileiro vem tentando repetir o sucesso de sua primeira edição. A verdade é que a paciência do telespectador brasileiro já havia se esgotado no fim da segunda. Na terceira, o fracasso de crítica só terminou de coroar o mau trabalho da edição brasileira do reality. A comparação com versões estrangeiras chega a ser deprimente. E isso não se restringe à notável diferença de qualidade: os participantes brasileiros parecem ter se rendido a uma modulação vocal que está longe de ser apreciada pela cultura brasileira. Consequência, talvez, da vitória do participante made in USA que venceu a segunda edição, um calouro de orientação soul e gospel (na minha opinião, bastante ruim). Na terceira, grande parte dos aspirantes transpareciam querer serguir o mesmo caminho. E o resultado não foi outro: pouca diversidade e muita gritaria, algo distante do que se viu, por exemplo, na elogiada primeira edição. A dupla sertaneja, configuração consagrada pela cultura brasileira, acabou ficando com o prêmio. E mereceu. Só para citar o óbvio: Cláudia Leitte, Carlinhos Brown, Lulu Santos e Daniel são insuportáveis. O time de jurados pode até ser composto por ótimos músicos. Carlinhos Brown é um dos nossos grandes nomes, por exemplo, Como jurados, porém, a bancada do The Voice  é over e cansa rápido.

3 - Em Família: A última novela de Manoel Carlos merecia destino melhor. Nos últimos anos, o premiado autor de Por Amor e Laços de Família negligenciou as suas tramas principais: Helenas insípidas quase sempre imersas em histórias pouco envolventes e não desenvolvidas. Nesse contexto, tramas paralelas se destacam. Em Família não foi diferente. Uma boa notícia para atores como Vanessa Gerbelli, Marcelo Mello Jr., Tainá Müller e Giovanna Antonelli. Destacaram-se em papéis coadjuvantes. Mas a trama principal, aquilo que dá razão de ser e argumento a uma novela, não se movimentou. Um erro fatal em qualquer novela. No contexto de Manoel Carlos, marcado pelo marasmo do cotidiano, tal aspecto foi ainda mais definitivo para sacramentar o fracasso.

segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

Melhores do Ano?

Ontem a Rede Globo levou ao ar a sua edição de 2014 de um prêmio que, ao menos no nome, objetiva premiar os melhores profissionais da casa: o Prêmio Melhores do Ano do Domingão do Faustão. Em um ano de novelas tão fracas, entretanto, o que se viu foi um desfile de corporativismo da emissora: em muitas categorias, ganhou a carinha de mais empatia com o público. E a falta de lógica não se restringiu à dramaturgia. Talvez abrir a votação totalmente para a participação popular tenha sido a grande força motriz de certos despropósitos: em que mundo a forçada Fernanda Gentil se destaca em um time de jornalistas composto por, entre outros, pessoas da excelência do também concorrente e renomado Caco Barcellos? Algum especialista pensa de fato que a irritante Cláudia Leitte é a melhor coisa que temos na música brasileira atual? Tsc. E Chay Suede, ainda que tenha ido bem em seu primeiro papel relevante em uma novela da Globo, passa muito longe do talento inquestionável de Jesuíta Barbosa e Irandhir Santos. Para coroar o clima de amigo oculto festivo e pouco compromissado com a qualidade, Cláudia Abreu, à parte de ser uma das maiores atrizes do país, levou o troféu de melhor atriz mesmo estando distante de estar entre as melhores do ano. É o preço que se paga por um troféu que, desde o seu nascimento, sempre esteve inclinado a vender o próprio peixe. Afinal, nomes como Marina Ruy Barbosa, Andrea Horta e Josie Pessoa, só para citar alguns, apenas entraram na conta deste ano por motivos meramente comerciais (e isso, vale ressaltar, não é um questionamento ao inegável talento das três atrizes). Ao menos no que diz respeito à teledramaturgia nacional, tal característica salta aos olhos em um ano tão fraco para as novelas: em um mar de poucas coisas realmente memoráveis, destacam-se apenas aqueles que, mesmo sem muita qualidade, estão sendo levados pela onda popular (que com frequência é ditada tão-somente pela indústria). 

domingo, 14 de dezembro de 2014

Masterchef Brasil é o grande acerto na categoria dos reality shows

Reality shows estão cada vez mais enfadonhos. O Big Brother Brasil, à parte de estar indo para sei lá qual edição, já não é mais algo que empolga a massa dos brasileiros. Sua fórmula, para lá de desgastada, causa ainda mais preguiça com a sucessiva repetição dos perfis que passeiam pela casa mais vigiada do PROJAC: homens bombados e mulheres gostosonas. Nada de muito notável. Realities musicais, por sua vez, caem quase sempre em um problema parecido: candidatos iguais. Revelar um artista é muito difícil nesses programas porque poucos participantes - e muito menos a direção - entendem que o conceito de artista é muito mais amplo do que a mera modulação vocal. Nisso, todos os competidores parecem pretender o posto de nova Whitney Houston ou novo Michael Jackson. Isso tudo aliado à péssima composição de jurados, como é o caso do The Voice, cansa o publico de maneira irremediável.

Mas um reality bastante bem conduzido vem distraindo nas noites de terça-feira: o Masterchef Brasil. Ainda que contenha alguns problemas de edição - que às vezes dá pequenos spoilers no decorrer do programa -, o Masterchef é sem dúvida bem executado e composto de uma forma muito sagaz. A direção, mesmo com seus problemas de edição, é em geral de muito bom gosto. O programa tem boa qualidade técnica e surpreende por levar ao ar um produto de tratamento muito seguro. Ao contrário do que se vê no exterior, os jurados brasileiros são uma mistura de rispidez e humanidade. É a humanidade, aliás, que causa a empatia do público (mas sem nenhum tipo de sensacionalismo barato). Os candidatos também foram muito bem selecionados. Perfis diferentes, cada um com a sua história, dão ao programa um ar de diversidade fundamental a uma produção baseada na competição. Diante da onda de reality shows que permeia a televisão mundial desde o final da década de 90, o Masterchef Brasil é, sem dúvida, uma das melhores coisas a observar.

domingo, 7 de dezembro de 2014

Recorrer ao absurdo nem sempre é sinal de inteligência

Em novelas de propostas lúdicas, acontecimentos estranhos se naturalizam. É o caso, por exemplo, de toda a cultura de realismo fantástico que permeou boa parte das obras de Dias Gomes, Aguinaldo Silva e Ricardo Linhares. Licenças poéticas também se mostram um ótimo recurso em novelas que pendem para o gênero da fantasia, mesmo quando o folhetim cai nessa lógica meio que por acidente, caso de "O Clone", obra mais emblemática da novelista Glória Perez.

 Mas em novelas contemporâneas no sentido mais estrito, como é o exemplo de Império, o recurso ao absurdo pode comprometer uma narrativa de matriz realista. É o que vem acontecendo com a novela nos últimos tempos: cadeias causais truncadas, personagens que mudam de personalidade (e até de orientação sexual) do dia para a noite, tipos que surgem na história sem muita razão aparente, tramas cada vez mais patéticas e desconectadas com o senso de razoabilidade. A substituição de Drica Moraes por Marjorie Estiano no papel de Cora apenas coroou a tendência que o autor vem imprimindo ao folhetim: de repente, Cora faz uma plástica e volta 20 anos mais jovem. É a radicalização do recurso ao absurdo, um instrumento muito típico das novelas de Dias Gomes. Parece que Aguinaldo Silva, à parte do seu malogrado esforço por se dedicar a tramas ambientadas no século XXI, não consegue se desgarrar de fato da lógica que o consagrou no rol de grandes autores: discípulo de Dias Gomes, foi na esteira do realismo mágico que Aguinaldo se consolidou. Em novelas como Império, em contrapartida, o recurso ao absurdo soa tão-somente como sinal de esquizofrenia. No caso em tela, o problema é maior: Cora voltou na cena mais errada possível. Foi introduzida de modo abrupto, sem nada que deixasse claro o motivo do rejuvenescimento. Não colou.

O desligamento de Drica pode ser comparado de forma oportuna com o problema pelo qual Ruy Vilhena, autor de Boogie Oogie, passou quando Giulia Gam, também a principal antagonista da novela, foi afastada do folhetim por indisciplina. Ruy, um autor mais contemporâneo e mais conectado com a forma atual de desenvolver roteiros, usou o contratempo a seu favor. Deu um sumiço em Carlota, personagem de Giulia, e fez disso o grande argumento dos acontecimentos que se seguiram. A novela se tornou mais dinâmica e ainda mais recheada de espertas reviravoltas. A entrada de Joanna Fomm como uma espécie de substituta de Giulia também deu muito certo. Tia Odete, papel de Joanna, movimentou a trama de maneira muito acertada. Não é por acaso que Ruy Vilhena vem sendo muito elogiado com o desenvolvimento de Boogie Oogie.

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Além de excessivamente conservadora, dramaturgia de Império é pouco crível

Que Império é uma das novelas mais moralmente conservadoras dos últimos anos, o blog já havia comentado. Depois das razoavelmente progressistas Amor à Vida e Em Família, Império estreou para escancarar os fantasmas mais retrógrados não apenas da sociedade, mas do próprio autor. Nas últimas semanas, o folhetim foi além: tratou de forma no mínimo leviana a questão da falta de moradia no país. O Brasil, uma nação com uma grande massa de pobres e um número bastante relevante de desabrigados, é coroado com uma novela que trata o assunto do modo mais raso: quem invade propriedade é só um vagabundo, como deixa a entender Aguinaldo Silva em seu texto digno de dramaturgo de jornalzinho.

Mas o que os últimos episódios de Império vêm demonstrando é um problema ainda maior: a tendência ao patético. Falta um elemento crível às tramas que se desenrolam na rede do folhetim. Dois exemplos: Maria Marta, a megera mais insuportável desde Tereza Cristina, manda trazer de algum lugar a sobrinha mal amada, a chatinha Amanda, a fim de acabar com o casamento do filho, José Pedro, com a sua indesejável nora, Danielle. Uma sobrinha, assim, que cai de pára-quedas em uma espécie de inexplicável pulo-do-gato. O motivo do exílio de Amanda, engendrado anos antes pelo Comendador, é ainda mais estranho: O todo-poderoso não apoiava o namorico da sobrinha da esposa com o filho, já que eram primos. Um argumento risível. Outro exemplo: a busca pelas tais quatro partes do diamante por boa parte do elenco. O eixo de Cora é ainda mais deprimente: a suposta vilã pretende trocar os diamantes por uma noite de sexo com José Alfredo. Chegou a matar um fulano no meio da empreitada. A maneira: empurrando-o da escada. Enfim, a novela caminha para um destino tão triste quanto o clichê do assassinato escada abaixo. Aguinaldo Silva, para não perder o costume, confirma a sua trajetória decadente. Talvez a mais decadente entre os grandes autores da emissora.

terça-feira, 25 de novembro de 2014

A falta do protagonismo negro nas novelas

O mais recente censo do IBGE (de 2010) comprova algo que intuitivamente já sabemos: a maioria da população brasileira é negra ou parda. Nas novelas, contudo, negros e pardos continuam como minoria. Vê-los nos folhetins brasileiros parece tarefa complicada, quase uma pesquisa árdua. Em geral, circulam pelas cozinhas ou pelas garagens dos motoristas. Nada de dramas complexos ou vidas próprias: os negros da Rede Globo servem apenas como ornamento - às vezes, como palhaços no núcleo cômico. É muito raro que tenham cenas mais elaboradas, caso de Sebastiana, a empregada - não nos diga? - que aos poucos vem ganhando espaço como show-woman da boate que dá nome à novela, Boogie Oogie. Mas mesmo esse tipo de trama, algo entre o pouco relevante e a figuração, é costume que se faz raro nas emissoras.

Nas novelas das oito, apenas 1 atriz negra conseguiu a façanha de ser protagonista: Taís Araújo. Entre os atores, nenhum mocinho negro deu o ar da graça até aqui. Taís Araújo é em geral a atriz negra que mais recebe papeis de destaque em outros horários, caso de Verônica, heroína de Geração Brasil. Seu marido, o também negro Lázaro Ramos, já teve outrossim seus personagens grandiosos. O maior deles (à exceção do coadjuvante Foguinho) talvez tenha sido Zé Maria, o protagonista da excelente Lado a Lado, novela que teve a sua força justamente nos excelentes questionamentos de fundo social - e vencedora do Emmy do ano passado. Camila Pitanga, parda, também tem a sua força: prestes a encarnar a mocinha da próxima novela das oito, Rio Babilônia, Camila fez sua carreira na televisão por meio de personagens marcantes: Bebel, a divertida prostituta de Paraíso Tropical, é um exemplo.

Portanto, podemos dizer que a Rede Globo ostenta em seus quadros três atores negros em seu primeiro escalão (digamos que há por volta de 30). Ainda assim, apenas uma novela das oito entre as cerca de 80 que a emissora já produziu na história foi protagonizada por uma atriz negra (Taís Araújo em Viver a Vida). No Brasil, relembremos, a maioria da população (desenhando, mais de 50%) é negra. Parece discrepante. Parece pouco. Parece fora da realidade. E é.

domingo, 16 de novembro de 2014

Boogie Oogie e o desfile de atrizes potentes

Entre os grandes méritos da atual novela das seis, encontra-se sem dúvida a ressurreição de grandes atrizes que, por um motivo ou outro, estavam sumidas do protagonismo da televisão. Boogie Oogie, nesse sentido, é um deleite para os olhos de fãs de grandes divas da teledramaturgia. Caso de Giulia Gam, indicada pelo blog como uma das melhores atrizes do ano, que está fazendo de sua Carlota uma das grandes forças motrizes do folhetim. Caso, também, de Alessandra Negrini, intérprete de Suzana, a carismática antagonista do mau caráter Fernando, personagem de Marco Ricca.

Mas a constelação de talentos bissextos não para por aí: Zezé Motta, por exemplo, atriz eternizada pelo filme ''Xica da Silva'', volta com uma personagem que dá gosto de ver: a desinibida Sebastiana. Betty Faria não fica atrás: Madalena surge como a grande matriarca da novela, uma vovó mais avant-garde do que todo o resto do elenco. Ana Rosa, outra veterana injustiçada pelo ostracismo dos últimos anos, consegue demonstrar toda a sua carga dramática na pele da sofrida Zuleica. E Thaís de Campos, figurinha repetida nas novelas da década de 90, volta com uma participação interessante em Boogie Oogie: Célia, sua personagem, é talvez a figura mais adequada à década retratada pelo folhetim. Mas é o retorno de Joana Fomm que chamou a atenção dos telespectadores nas últimas semanas. E em um papel matador: Odete, a suposta tia de Carlota, é ácida, ferina e manipuladora. Uma atriz maravilhosa, de técnica ímpar, que, por motivos de saúde, obrigou-se a recusar os últimos convites de sua carreira. E vem mostrando que continua dando show.

Mas não só de atrizes veteranas Boogie Oogie é feita: Sandra Coverloni (a Augusta), nome experiente do cinema laureado em Cannes, praticamente debutou nas novelas recentemente. E vem apresentando toda a sua competência. Alexandra Richter (a Luísa), Heloísa Perissé (Beatriz) e Rita Elmor (a Leonor) são também nomes recentes no cenário da teledramaturgia. Todas muito competentes. Já Fabíula Nascimento é um espetáculo à parte. A atriz já havia se destacado como a Olenka de Avenida Brasil. Entretanto, é em Boogie Oogie que a atriz encontrou todos os instrumentos para demonstrar o máximo de seu talento. A rancorosa Cristina é um espetáculo, como personagem e como composição. Mesmo atrizes que costumam emendar novelas estão em ótimas atuações: Débora Secco (a Inês) e Letícia Spiller (Gilda) são dois ótimos exemplos. Para completar, a novela é encabeçada pela correta Isis Valverde, ainda que Sandra suma um pouco da vista do telespectador diante de tantos bons personagens ao seu redor. Um deles, a patricinha Vitória, é diretamente responsável pelo ofuscamento da protagonista: Bianca Bin, para variar, também está inspiradíssima - atrevo-me a dizer que ela está em seu melhor papel.

terça-feira, 11 de novembro de 2014

Melhores do Ano - IV Prêmio Leila Diniz

A votação dos melhores deste ano será aberta aos leitores do blog. Ela ficará disponível durante os meses de novembro e dezembro. O resultado será divulgado em Janeiro. Somente as categorias não-técnicas estarão sujeitas à votação. Vote!


VOTAÇÃO ENCERRADA EM 30/12/14

domingo, 9 de novembro de 2014

Primeiras Impressões: Alto Astral

Novelas espiritualistas já não são nenhuma novidade: da célebre A Viagem à recente Alma Gêmea, o assunto aparece na telinha das emissoras de televisão com mais frequência do que pensamos. Novelas espiritualistas e cômicas, nesse mesmo sentido, também se encontram entre os conceitos pra lá de batidos: O Anjo Caiu do Céu e Deus Nos Acuda, por exemplo, tinham o mesmo contexto. E Alto Astral segue à risca a receita de apostar no seguro arroz-com-feijão: um amor que desafia a razão, o vilão implacável e sedutor, a cidadezinha de interior majoritariamente ocupada por personagens tão humildes quanto insossos. Nem a abertura é novidade: uma versão mais elaborada de Aquele Beijo embalada por uma das canções mais utilizadas pelas novelas brasileiras (Alma, de Zélia Duncan). A Rede Globo, talvez por conta dos fracassos de Geração Brasil e Além do Horizonte, decidiu jogar as suas fichas em algo que sempre funcionou.

E de certa forma continua a funcionar. A novela, como um todo, é correta. Entretém, é bem-escrita e bem-desenvolvida. Acompanhá-la não é nenhum fardo, visto que o enredo, além de tratar o tema com extrema leveza, caminha sempre dentro dos seguros limites do folhetim tradicional. A direção às vezes se mostra anacrônica, muito provável por conta dessa necessidade da produção em resgatar a nostalgia das novelas mais clássicas. Nada, porém, que comprometa a correição do conjunto. Os personagens, por sua vez, não são muito complexos: todos seguem a mesma receita do 'menos é mais'. Temperamentos controversos passam longe do carteado de personagens de Alto Astral. O elenco, à parte de uma peça aqui e ali, é bem escalado. No time de protagonistas, apenas Thiago Lacerda pareceu pouco à vontade. Mas é também do time de protagonistas que surge a principal figura da novela até o momento: Cláudia Raia. Samanta transforma todas as suas cenas em acontecimentos épicos: nada na vida da trambiqueira resulta em aparecimentos banais. E Raia, em casa com esta personagem, usa muito bem o que sabe fazer para ganhar destaque.

De qualquer maneira, não há como não fazer menção à autora da sinopse de Alto Astral, Andrea Maltarolli, a talentosíssima novelista que, para tristeza geral, faleceu em 2009. Na Rede Globo, escreveu a ótima Beleza Pura, folhetim que indiciava as marcas de uma carreira promissora. Carreira que, por uma fatalidade, esbarrou em uma doença fatal: e nada mais intrigante que a sua última sinopse carregasse elementos espiritualistas. Em Alto Astral, a marca de Andrea Maltarolli é notável - e arrisco a dizer que é exatamente sobre as suas marcas que a novela ganha seus pontos altos. Coube ao competente Daniel Ortiz, colaborador do malogrado remake de Guerra dos Sexos, a empreitada de desenvolver a novela. Afirmar se a novela vai ou não emplacar no horário é tarefa difícil. O que se pode dizer, porém, é que, de um jeito ou de outro, Andrea sentiria orgulho dos frutos que deixou por aqui.

segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Entre altos e (muito) baixos, Geração Brasil parte sem deixar saudades

Há quem diga que Geração Brasil tenha pecado por desafiar o folhetim tradicional. Na minha visão, o grande legado dessa controversa novela foi justamente a sua vontade de revolucionar. Nos personagens, na estrutura dos diálogos, na trilha sonora: o maior ponto positivo nesse folhetim foi o vanguardismo. Alguns de seus personagens, a propósito, serão inesquecíveis: Barata, a Família Parker-Marra, Dorothy Benson, exemplos não faltam para preencher a nossa argumentação. Os diálogos, outra boa inovação, às vezes se convertiam em monólogos. A trilha sonora, por fim, outrossim fugiu do tradicional: da ótima "Alma Sebosa", de Johnny Hooker, até a excelente "Combat Lover", de Nina Kinert.

Mas nada disso funciona sem história. Todo vanguardismo, se não for circundado de um desenvolvimento consistente, vira circo, uma loucura sem sentido. E foi exatamente isso o que aconteceu: Geração Brasil, de forma notável em sua metade, virou uma espécie de show injustificado de excentricidades. Os personagens se tornaram palhaços, os monólogos cansaram e a trilha sonora apenas coroou aquele pandemônio pouco elaborado (um kitsch que, muito longe de uma desordem felliniana, chegava ao ponto de ser de extremo mau gosto). Na reta final, já quando não havia mais salvação, os autores engrenaram. Voltaram a acertar o ponto do feijão: a trama principal ganhou corpo e a ascensão de Herval (Ricardo Tozzi) como grande vilão mostrou-se positiva. De certa maneira, a ligação entre conclusão e introdução foi muito coerente. Poucas pontas soltas ficaram entre o início e o fim. Só que faltou o meio.

Seja como for, a dupla Izabel de Oliveira e Filipe Miguez ainda podem ser considerados grandes promessas da nova geração. Ousadia não falta. Talvez o que ainda falte, uma boa dose de responsabilidade, seja algo que venha com o tempo.


Avaliação: Mediana.

Melhores do Ano de 2014 (Indicados)



Período de Votação: De 11 de novembro a 30 de dezembro.
Resultado: 30 de dezembro.


Atuação Feminina em Série Nacional 
Cássia Kis Magro (Amores Roubados)
Dira Paes (Amores Roubados)
Fernanda Montenegro (Doce de Mãe)
Isis Valverde (Amores Roubados)
Patrícia Pillar (Amores Roubados)


Atuação Masculina em Série Nacional
Bruno Gagliasso (Dupla Identidade)
Cauã Reymond (Amores Roubados)
Irandhir Santos (Amores Roubados)
Murilo Benício (Amores Roubados)
Osmar Prado (Amores Roubados)


Série Nacional 
A Grande Família (Oduvaldo Vianna Filho e Armando Costa)
Amores Roubados (George Moura)
Doce de Mãe (Jorge Furtado)
O Negócio (Lucas Paiva Mello e Rodrigo Castillo)
Sessão de Terapia (Selton Mello)


Trilha Sonora
Amores Roubados (José Luiz Villamarim)
Boogie Oogie (Ricardo Waddington e Gustavo Fernandez)
Geração Brasil (Denise Saraceni)
Meu Pedacinho de Chão (Luiz Fernando Carvalho)
O Rebu (José Luiz Villamarim)


Fotografia
Além do Horizonte (Paulo Souza)
Amores Roubados (Walther Carvalho)
Império (Sérgio Tortori e Fernanda Silva Santos)
Meu Pedacinho de Chão (José Tadeu)
O Rebu (Walther Carvalho)


Figurino
Boogie Oogie (Marie Salles)
Geração Brasil (Gogoia Sampaio)
Império (Helena Gastal)
Meu Pedacinho de Chão (Thanara Schoernardie)
O Rebu (Marília Carneiro e Keka Pinto)


Direção de Arte
Amores Roubados (Mário Monteiro)
Boogie Oogie (Nininha Medicis)
Doce de Mãe (Fiapo Barth)
Meu Pedacinho de Chão (Marco Cortez)
O Rebu (Lila Bôscoli e Tiza Oliveira)


Abertura
Além do Horizonte
Boogie Oogie
Meu Pedacinho de Chão
O Rebu
Pé Na Cova


Direção
José Luiz Villamarim (Amores Roubados)
José Luiz Villamarim (O Rebu)
Luiz Fernando Carvalho (Meu Pedacinho de Chão)
Ricardo Waddington e Gustavo Fernandez (Boogie Oogie)
Rogério Gomes (Império)
  

Autor
Christianne Fridman (Vitória)
George Moura (Amores Roubados)
George Moura e Sérgio Goldenberg (O Rebu)
Jorge Furtado (Doce de Mãe)
Ruy Vilhena (Boogie Oogie)


Ator Coadjuvante
Ailton Graça (Império)
Jesuíta Barbosa (O Rebu)
Leandro Hassum (Geração Brasil)
Luís Miranda (Geração Brasil)
Marcelo Mello Jr. (Em Família)


Atriz Coadjuvante
Camila Morgado (O Rebu)
Cássia Kis Magro (O Rebu)
Giovanna Rispoli (Boogie Oogie)
Marjorie Estiano (Império)
Vanessa Gerbelli (Em Família)


Ator
Alexandre Nero (Império)
Irandhir Santos (Meu Pedacinho de Chão)
José Mayer (Império)
Osmar Prado (Meu Pedacinho de Chão)
Tony Ramos (O Rebu)


Atriz
Drica Moraes (Império)
Giulia Gam (Boogie Oogie)
Lília Cabral (Império)
Patrícia Pillar (O Rebu)
Sophie Charlotte (O Rebu)


Novela
Boogie Oogie (Ruy Vilhena)
Geração Brasil (Izabel de Oliveira e Filipe Miguez)
Império (Aguinaldo Silva)
Meu Pedacinho de Chão (Benedito Ruy Barbosa)
O Rebu (George Moura e Sérgio Goldenberg)

sábado, 25 de outubro de 2014

IMPÉRIO: De novela emblemática a folhetim insosso



Império, novela que pretendia ser a redenção de Aguinaldo Silva depois das sofríveis Duas Caras e Fina Estampa, estreou há alguns meses deixando a impressão de que seria emblemática. E com toda a justiça: uma trama principal arrebatadora circundada por debates muito polêmicos do ponto de vista moral. Mas Aguinaldo, talvez por conta de sua recente postura conservadora (política e artística), conseguiu, ao mesmo tempo, transformar o centro de seu folhetim em algo não muito dinâmico e esvaziar completamente todos os questionamentos que, nas primeiras semanas, surgiam como diferenciais.

Comecemos pela trama principal. Aguinaldo iniciara bem: uma mocinha bem-conduzida interpretada pela sempre segura Leandra Leal; vilãs imperdíveis e defendidas por duas das maiores atrizes do Brasil, Lília Cabral e Drica Moraes; um protagonista charmoso e com uma boa dose de excentricidade. Mas eis que, diante de seu senso de condução conservador, Aguinaldo cometeu um pecado: transformou todos esses personagens em caricaturas insuportáveis. Cristina, a mocinha, virou, digamos, uma mocinhazinha (minguada, aguada, sem muita complexidade dramática). Maria Marta, a vilã de Lília Cabral, chegou a um tom de arrogância ainda mais insuportável do que o de Tereza Cristina, a antagonista de quadrinhos encenada por Christiane Torloni em Fina Estampa. Cora, a prometida megera de Drica Moraes, virou uma carola patética (pelo visto, Violante – de Xica da Silva –, seguirá sendo sua maior personagem). O Comendador, por fim, perdeu a empatia ao passo que foi perdendo em complexidade.

Por fim, a pólvora da novela, os vários personagens homossexuais – que suscitariam, cada um a seu modo, boas reflexões – perderam a razão de ser: Cláudio foi inserido em uma discussão chatíssima sobre direito à privacidade. Sejamos sinceros: a única pessoa que está preocupada com esse ponto de vista neste país é a perdida Paula Lavigne. Leonardo descobriu-se bissexual e parece ter passado por um ritual de machoalfação. Virou escada da personagem de Adriana Birolli, a péssima atriz que, por algum motivo que nos escapa, é a queridinha do autor.  Xana, e esta é a personagem cuja mudança é a mais lamentável, vem perdendo a sua humanidade em benefício de um humor que, sendo muito boazinha, é no mínimo idiossincrático (a propósito, Xana também foi heterossexualizada depois de, nas primeiras semanas, ter declarado a sua afeição por Elivaldo). Téo Pereira, que nunca teve lá muita complexidade, é o único que continua como começou.

Assim, Império se transformou em um limbo que acontece entre o Jornal Nacional e a primeira faixa de shows da emissora (e diante da crise de audiência da Globo, isto é de fato significativo). Não repercute nas redes sociais, no sofá ou na padaria. Não é ruim o suficiente para ser metralhada nem boa o bastante para ser elogiada. Só repercute na Veja, que não por coincidência é editada por amigos do autor. Lamentável. E que venha Gilberto Braga.