terça-feira, 16 de setembro de 2014

Defesa de Miguel Falabella: porque o politicamente incorreto nem sempre é ultrajante

Miguel Falabella sempre se notabilizou por dar voz a uma série de minorias: com frequência, suas novelas e seriados contam com personagens negros, gays e transgêneros. Por conta disso, recebi com estranheza a denúncia de racismo envolvendo o seu novo seriado, "Sexo e as Negas", um preconceito que, segundo a militância, estaria ligado ao caráter estereotipado conferido às protagonistas.

Mas é óbvio que a dramaturgia de Falabella é politicamente incorreta. E não há, de partida, problema com isso. O politicamente incorreto pode ser, sim, bem utilizado. Costuma ser o caso de Pedro Almodóvar, cineasta espanhol, só para dar um exemplo. Também costuma ser o caso de Miguel Falabella. Ver problemas no termo "nega" é um contrassenso. Antes, penso eu que a postura mais adequada é assumi-lo, agregá-lo, utilizá-lo como estratégia de empoderamento. Algo como as feministas e sua relação com a palavra slut. Não vejo, da mesma forma, motivo para um incômodo diante das protagonistas serem moradoras de uma comunidade. É um retrato, um recorte, um quadro sociológico comum e que pode, por que não, ser retratado como ficção. É até preconceituoso pensar que, por serem faveladas, as mulheres negras não mereçam o glamour de um seriado global: a médica é mais exemplo do que a faxineira? Uma bobagem. 

É claro que desconstruir estereótipos é uma necessidade premente. Isso passa por retratar mulheres negras em cargos que exigem maior qualificação acadêmica. Algo que Miguel Falabella, vale lembrar, já fez em outras oportunidades. Isabel Fillardis, por exemplo, interpretou Violeta da Mata, uma respeitada administradora de empresas em A Lua Me Disse. Mas o que passa por Sexo e as Negas tem relação com outras desconstruções: trata-se de dar protagonismo às negras de periferia, colocar voz em suas ânsias, trazê-las para o centro dos holofotes.

De fato, o politicamente incorreto é recorrentemente ultrajante no contexto da televisão. João Emanuel Carneiro talvez seja os campeão de um tipo de humor bobo, fácil e pouco elaborado. A respeito dele, entretanto, nunca vi nenhum tipo de comoção por parte da militância. No mínimo, injusto.

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